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sexta-feira, 14 de março de 2014

De quando eu resolvi ser doida do lado contrário…


Um dia minha tia displicentemente me disse que ela era doida do lado certo e eu,  doida do lado contrário.

E foi assim… eu a doida do lado contrário, e ela a doida do lado certo (pelo menos antes de lhe abrirem a cabeça com um serrote, espero que tenham-lhe feito alguma alteração na ocasião).

E a partir daí eu me assumi assim: ser doida do lado contrário.

Ser uma doida do lado contrário dói um pouco às vezes, dói também às pessoas que acham erroneamente que ser doida do lado ao contrário significa ser louca: não, eu nunca fui louca!

Ser doida do lado contrário pressupõe dizer “não” a uma série de regras impostas por uma sociedade meio caduca. Pressupõe querer viver a vida, e não passar por ela de maneira incógnita, e nem sair dela de forma ilesa: há arranhões, marcas, cicatrizes muitas.

Um dia minha tia disse que era minha amiga. Não entendi direito à época o que aquilo queria dizer. Acho que ela quis dizer que ser minha tia era uma situação inevitável, um fato sobre o qual ela não tinha controle, a vida nos fez assim com esse título, esse rótulo. Mas ser amiga não, era uma escolha dela, da vontade exclusiva dela. Acho que eu achei que ela quis dizer que eu era de certa forma especial. Me segurei a isso algumas vezes quando eu fiquei triste.

Acho que quando ela disse que era minha amiga, ela quis dizer que seria a única pessoa a me dar um abraço quando eu chorei um dia. Quando se abraça alguém que chora, parece-me que a pessoa mergulha um pouco na sua lágrima, leva consigo, naquele abraço, algumas poças, ou ajuda a estancar o olho que sangra.

Um dia minha tia disse que eu era adorável quando criança. Adorável, eu sei, até ficar doida... doida do lado contrário: as doidas do lado contrário nunca podem ser adoráveis, a elas está reservado o degredo.

Um dia minha tia resolveu dizer um não. As doidas do lado certo nunca dizem não, elas aceitam suas vidas medíocres: sua sandice não atravessa janelas. Acho que ela ficou com um pouco de inveja de mim. Resolveu ser um pouco doida do lado contrário, disse não dizendo sim a si, à sua vida, aos seus desejos, ao amor! Dizendo não a certas convenções, costumes, ideologias. Só às doidas do lado contrário é reservado o direito de viver intensamente. Deve ter gostado da ideia, de ser esse lado doida e não do outro que lhe era tão familiar.

Foi boa mãe da sua única filha, agora quer ser avó, foi largando assim o posto imposto de tia por ter obrigações mais nobres – sábia ela! que um dia fez a escolha volitiva de não ser tia, de ser a doida do lado certo, amiga da doida do lado contrário, e às vezes... vice-versa.


Eu que às vezes tenho de ser uma doida do lado bem certo por força da ocasião, por causa da minha tia escolhi nunca ser “normal”, ou “não doida” como queiram, de nenhum lado: nem do certo, nem do contrário. Mas ela me ensinou também a não ser doida do lado errado... nem doida só. E assim eu escolhi.

2 comentários:

  1. DE QUANDO RESOLVI AMAR UMA DOIDA DO LADO AO CONTRÁRIO.

    Um dia carreguei no colo uma menininha que nem era minha, somente sobrinha, que me capturou com seus olhos cor de mel... encantadores, e, por sua doce forma de ser.
    Andava descalça, de calcinha colorida, que sempre se atrapalhava na sua bundoza (termo de seu pai, meu irmão), pois era gordinha e tão redondinha.
    Essa minha sobrinha, alegre, matreira, resolvida e adorável, tinha sempre tantos cachos que se balançavam ao vento e a levariam um dia, para buscar seus próprios caminhos.
    Às vezes entendia as frases de forma totalmente concreta, ao pé da letra, e, assim, acabou pelada na sala da casa da minha mãe, no meio dos namorados de suas tias, tudo por que pedi que trocasse de roupa no quarto, e, foi, mas voltou peladinha, era o que havia entendido.
    Essa minha sobrinha era uma menininha doidinha do lado ao contrário, pois somente assim as pessoas conseguem viver em meio aos sonhos e fantasias, sem perder a identidade ou se perder no mundo.
    E, ainda, se vestia de “Alice”, transformava-se em “Alice”!
    “Sou Alice, sim!”. Isso ainda ressoa em mim, ainda consigo ter na lembrança o gesto de reverência ao terminar aquela apresentação. Escuto até hoje as salvas de palmas e tudo o que é de direito a alguém famoso, artista, seja o que for. Batíamos palmas, todos, era a nossa estrela!
    A casa de minha mãe se transformava no “País das Maravilhas” com tanta magia! Era o que eu via e sentia. Sem música instrumental, somente a voz e a dança de minha sobrinha, que tinha um tom leve de princesa abençoada por fadas. Os seus cachos nesses momentos, dourados como mel, reluziam como luz !!!
    Um dia, fizemos um pacto e selamos nossa amizade, por um segredo só nosso que descobrimos juntas, o meu, o dela. Ela com três aninhos e eu com vinte e uns.
    E, assim, sonhamos juntas as fantasias dos contos de fadas, e ela me transportava com sua fala enganadora de que um dia, quando eu me casasse, iria virar princesa, já que na casa de minha mãe tinha afazeres diversos (lavar, arrumar a casa, limpar o chão). Esperei por isso por muito tempo, mas não aconteceu, graças a Deus! Virei mulher de verdade e ela também, com muitos sonhos ainda, muito para viver e fazer.
    Não sei se consegui afagar seu choro, se mergulhei em suas lágrimas e se a ajudei a estancar a dor de um olho que sangra, pois eu quis, quis muito que o mundo lhe desse tudo, toda a felicidade possível e um sustinho, às vezes, para dar impulso novo na vida.
    Um dia nosso laço esticou demais e quase partiu, acho que foi quando resolvi viver um pouco doida do lado ao contrário, e ela doida do lado certo, mas não deu certo essa troca perversa. Melhor viver feito era e assim apertamos os laços, ela adulta e eu madura, decididas às vezes indecisas, mas com muita vida para ser vivida.
    Hoje, vejo a minha sobrinha um dia Alice, doidinha do lado ao contrário, feito viu Bartolomeu as borboletas no seu livro, “Pedro”...
    “Borboleta é como o arco-íris ou bola de sabão: o máximo que sabemos é que tem muita cor e alegrias descontroladas”.

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